terça-feira, 12 de setembro de 2017

'SOU DOENTE E NÃO TENHO VONTADE DE VIVER' CONHEÇA A HISTÓRIA DE HÉBERSON, PRESO INJUSTAMENTE E CONTRAIU HIV APÓS SOFRER ESTUPRO COLETIVO NA PRISÃO


A ausência de dados oficiais sobre as prisões provocadas por erros dos agentes públicos é um indício da invisibilidade dessas “vítimas” do sistema penal: órgão do Ministério da Justiça, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) diz não contar com estudos a respeito de condenados injustamente e sugere uma consulta aos bancos de dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); já o CNJ afirma não acompanhar esses casos e sugere que o Depen seja procurado. Pesquisas independentes, no entanto, mostram a gravidade das prisões injustas no Brasil. Em 2013, só no Rio, 772 foram presos, supostamente em flagrante, para depois serem absolvidos. O levantamento foi realizado pelo Instituto Sou da Paz em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Cândido Mendes. O número, que inclui pessoas inocentadas e liberadas por falta de provas, corresponde a cerca de 10% dos 7.734 flagrantes na cidade durante o ano.

— Isso mostra a triste realidade do sistema de Justiça criminal no Brasil — critica Ivan Marques, diretor do Instituto Sou da Paz: — Nossos juízes e policiais têm uma ânsia de encarcerar as pessoas. Os erros cometidos não são poucos. Há casos de gente presa provisoriamente por mais de cem dias e que depois é absolvida. É um absurdo do ponto de vista público, pelo valor gasto pelo Estado em prisões, e um fracasso do ponto de vista humano.

Foto reprodução

Para Héberson Lima, de 35 anos, o tempo em que esteve na prisão levou não apenas dois anos e sete meses, mas também tomou dele trabalho, saúde, a família e a vontade de viver. O então ex-pedreiro foi preso em 2003, ao ser acusado por um vizinho de estuprar uma criança de 9 anos em Manaus. No cárcere, ele foi violentado diversas vezes e adquiriu HIV. O caso mudou de rumo apenas quando a defensora pública Ilmair Faria Siqueira constatou que, embora a vítima tivesse reconhecido Héberson, as feições descritas pela menina não coincidiam com a do acusado. Segundo seu relato inicial, o verdadeiro autor do crime era banguela, alto e “aloirado”, um perfil que definitivamente não era o de Héberson.

— Quando o promotor viu o resultado da perícia sobre as características físicas, não teve opção, a não ser a absolvição — relata a defensora.

Uma década após ser solto, o amazonense ainda tenta que os danos que sofreu sejam reparados. Depois da prisão, ele perdeu o emprego, separou-se da mulher e teve de se submeter a tratamento para o HIV. Entre idas e vindas de processos pedindo indenização, ele agora aguarda o desfecho de ação em que solicita R$ 150 mil do Estado em favor dos dois filhos, de 13 e 15 anos.

— A prisão só me trouxe desgraça. Ficávamos amontoados, e os presos se maltratavam. Eu achava que ia sair, mas passou o primeiro ano, o segundo ano, e eu fiquei esperando. Pensei em suicídio — lembra Héberson: — Hoje, sou doente e não tenho vontade de viver. Trabalho fazendo bico, um pouco aqui e ali. Mas nem esforço físico eu posso fazer.

Ao ser questionado sobre a expectativa em ainda receber ressarcimento pela prisão, ele dispara: — A esperança é a última que morre, mas tomara que eu não morra antes dela.


*Com informações de O Globo

Nenhum comentário:

Postar um comentário

AVISO: O conteúdo de cada comentário é de única e exclusiva responsabilidade do autor da mensagem.