O governo brasileiro afirmou na noite desta quarta-feira que entrará em contato com a ONU para oferecer esclarecimentos sobre as medidas que vem tomando em relação à tragédia de Mariana.
No início do dia, a ONU fez duras críticas ao que considerou uma resposta “inaceitável” por parte do governo e também da Vale e da mineradora anglo-australiana BHP.
E um comunicado com declarações de seu relator especial para assuntos de Direitos Humanos e Meio Ambiente, John Knox, e do relator para Direitos Humanos e Substâncias Tóxicas, Baskut Tuncak, a ONU criticou a demora de três semanas para a divulgação de informações sobre os riscos gerados pelos bilhões de litros de lama vazados no Rio Doce pelo rompimento da barragem, no último dia 5.
"As providências tomadas pelo governo brasileiro, a Vale e a BHP para prevenir danos foram claramente insuficientes. As empresas e o governo deveriam estar fazendo tudo que podem para prevenir mais problemas, o que inclui a exposição a metais pesados e substâncias tóxicas. Este não é o momento para posturas defensivas", disseram os especialistas da ONU no documento.
Em resposta, a Presidência informou que entrará em contato com a ONU para esclarecer seis pontos do comunicado: atendimento emergencial, abastecimento de água, monitoramento do Rio Doce, multas à Samarco, recuperação do Rio Doce, e força-tarefa para salvar animais ameaçados. O governo brasileiro afirmou que “o Serviço Geológico Brasileiro (CPRM) antecipou o início da operação 24 horas de monitoramento contínuo do Sistema de Alerta da Bacia do Rio Doce”, monitorando amostras de água e concluindo que “não há indicações de que a lama seja tóxica em relação a metais pesados.”
Esclareceu, no entanto, que “os resultados obtidos em mais de 40 coletas mostram uma quantidade de material em suspensão (turbidez) muito acima dos valores observados pela CPRM em 2010. Além da turbidez, os resultados revelam também uma diminuição significativa na quantidade de oxigênio dissolvido na água que pode está relacionada com a mortandade de peixes.”
Isso porque, em sua crítica, a ONU menciona a contradição nas informações divulgadas sobre o desastre, em especial a insistência da Samarco, joint venture formada por Vale e BHP para explorar minérios na região, de que a lama não continha substâncias tóxicas. E descreve com detalhes o desastre ecológico provocado pelo vazamento, incluindo a chegada da lama ao mar.
"As autoridades brasileiras precisam discutir se a legislação para a atividade mineradora é consistente com os padrões internacionais de direitos humanos, incluindo o direito à informação. O Estado tem a obrigação de gerar, atualizar e disseminar informações sobre o impacto ambiental e presença de substâncias nocivas, ao passo que empresas têm a responsabilidade de respeitar os direitos humanos", afirmou Tuncak.
Multa e diálogo
A nota da Presidência também cita a multa de R$ 250 milhões à Samarco e diz que “o governo vem cobrando a atuação da empresa na contenção e na reparação dos danos causados pela tragédia”.
O comunicado salientou ainda que o governo federal “iniciou um diálogo com os governos mineiro e capixaba para definir um plano conjunto de recuperação da Bacia Hidrográfica do Rio Doce” e “vêm fazendo ações de emergência para proteger a fauna da região afetada pela catástrofe, como a retirada de ovos de tartaruga de locais ameaçados na costa capixaba, bem como a captura e transporte de matrizes de peixes também ameaçados.
Em entrevistas, a presidente Dilma Rousseff tem negado negligência no caso. A Samarco, por sua vez, tem afirmado que suas operações eram regulares, licenciadas e monitoradas dentro dos melhores padrões de monitoramento de barragens.
Nesta quarta-feira pela manhã, no programa Bom Dia Ministro, os ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Gilberto Occhi (Integração Nacional) disseram que "desde o primeiro momento" o governo "atuou em uma força tarefa com todos os setores na busca de salvar pessoas".
Quadro desolador
Os dois especialistas classificaram a tragédia como mais um exemplo de negligência de empresas em proteger os direitos humanos e traçam um quadro desolador pós-desastre para as comunidades afetadas.
"Poderemos jamais ter um remédio eficaz para as vítimas, cujos parentes ou ganha-pão podem estar debaixo dessa onda de lixo tóxico, e nem para o meio ambiente, que sofreu danos irreparáveis. Empresas trabalhando com atividades envolvendo o uso de material de risco precisam ter a prevenção de acidentes no centro de seu modelo de negócios."
A BBC Brasil entrou em contato com a Samarco, a Vale e a BHP. Até a noite desta quarta-feira, a Vale respondeu dizendo que não comentaria a nota da ONU mas que esclarece, em seu site, que os rejeitos de mineração não são tóxicos.
A Samarco afirmou que "respeita o direito de expressão da ONU, porém afirma que todas as medidas estão sendo tomadas para prestar assistência emergencial às famílias e comunidades afetadas e para a mitigação das consequências socioambientais desse acidente" e que "desde a ocorrência do acidente em sua Barragem de Fundão vem permanentemente informando à sociedade, autoridades e imprensa que o material proveniente das barragens não apresenta perigo à saúde humana".
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